Depois das eleições francesas de ontem espera-nos a habitual semana de troca de comentários com diferentes pessoas a dizer as mesmas coisas. Sim, milhões votaram na Le Pen e isso dá que pensar. Sim, a "Europa"está moribunda e isto pode ter sido só adiar a inevitável espiral da desgraça. Não, o populismo não acabou aqui e continuará a grassar pelo continente, desde que vivemos no planeta Trump tudo é possível.
E depois vem o tema que será abordado, e de onde poderia saír todo um novo debate, mas onde é duvidoso se chegue a uma conclusão diferente do habitual: é que Macron foi o primeiro presidente da república francesa que não saiu de um grande partido, e foi eleito praticamente como independente, com um partido criado de improviso para a campanha. E aí vamos ouvir horas a fio de políticos e outros especialistas a falarem da crise dos partidos tradicionais, e da perda da sua ligação ao eleitorado, alguns até arriscarão soluções genéricas para o problema, mas nenhum a tentará um diagnóstico diferente dos que já ouvimos ou sugerirá sequer uma sombra de uma explicação consistente para o fenómeno.
Para mim, que não sou político, especialista em política ou coisa que o valha, apenas um cidadão comum com interesse em estar informado e doses de curiosidade cepticismo que nunca me deixaram ficar mal, o problema parece-me claro: no plano das ideias, continuamos todos a viver no passado, a falar do passado e a raciocinar como no passado, e é isso que explica a aparente falta de solução visível para os problemas que nos afligem.
Se virmos a história das ideias políticas mais comuns nos nossos dias constatamos que todas têm uma coisa em comum, desde o comunismo, que surgiu para responder aos excessos da revolução industrial e do capitalismo, à ideia inovadora de que o Estado devia ter uma função social, que surgiu na Alemanha de Bismarck para responder à ascensão do comunismo, passando pelo liberalismo, que surgiu como reacção aos estado fiscal (que assume que tudo o que produzimos é tendencialmente propriedade sua e que as dívidas do País são dos cidadãos) em que se transformaram os países ocidentais da I Guerra Mundial em diante: são todas produto do passado e circunstâncias passadas.
Vivemos por isso num mundo onde os comunistas reverenciam ideias e autores do século XIX, os liberais clássicos ideias e autores do início do Século XX, os neoliberais ideias e economistas da segunda metade do Século passado e por aí fora. Apesar de estarmos neste momento no olho de um furacão de mudança comparável ao da Revolução Industrial (que gerou as correntes e contra-correntes ideológicas que ainda nos acompanham) os conceitos e ideias usados para enquadrar os problemas e definir soluções são sem excepção mais velhos do que os homens que os tentam usar, mas há um deserto de teorias e soluções consistentes aplicáveis à realidade que efectivamente vivemos.
Se for verdade que a história é cíclica aguardam-nos ainda umas décadas de problemas, miséria, conflitos e até guerras até a humanidade encontrar uma forma de progredir em conjunto para novo e melhor estágio de desenvolvimento. E se não deixa de ser angustiante a consciência de que ao dia de hoje não há pensadores que nos orientem ou políticos que nos ajudem a percorrer o caminho, a verdade é que eles acabarão por surgir, porque depois da tempestade vem sempre a bonança, o que é sempre notícia, mesmo que signifique que só os nossos netos é que deixarão verdadeiramente de andar à chuva.